quarta-feira, 7 de maio de 2014

As batalhas medievais e o cinema



Desde pequeno, sempre adorei filmes com ambientação medieval ou (melhor ainda) fantasia medieval. Castelos, cavaleiros, duelos de espada, princesas... o pacote completo. Mas tinha um momento específico em todos estes filmes que me deixavam mais empolgado, pulando no sofá. As grandes batalhas.

Centenas ou milhares de humanos (ou monstros) de armadura, se acertando furiosamente com espadas e machados, em uma porradaria franca e sanguinária. Até nos RPGs que eu jogava ou narrava, minha intenção (nem sempre realizada) era sempre participar de guerras e batalhas campais. Pra ter uma noção, eu achava armas de fogo coisa de covarde, e só fui me interessar pro guerra moderna depois de Tropa de Elite e Band of Brothers.

Dando um salto adiante, o interesse por Idade Média me levou a estudar universitariamente História, e o interesse por batalhas me levou a estudar (extra-universitariamente) História Militar e Estudos Estratégicos. Chegando ao ponto de pesquisar manuais da época e assistir a dezenas de vídeos de reconstituições realistas de combates.

Mas aí entra a ironia da coisa: quanto mais eu aprendo sobre a realidade das batalhas medievais, mais difícil fica tolerar os filmes sobre isso. Eles erram muito! MUITO! Alguns mais do que outros, mas, de modo geral, não consigo assistir uma cena sem uma contagem de pelo menos cinco facepalms pro minuto.

Resolvi então escrever este texto, expondo apenas os "erros" (ou escolhas) mais básicos e mais comuns cometidos pelos cineastas.

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1. Formação de combate

Essa é a que mais dói de ver. Ao invés dos combatentes se organizarem em linhas e blocos, defenderem posições e lentamente ganharem ou perderem terreno, eles simplesmente se espalham por um campo e começam a lutar combates individuais, onde os personagens principais matam dezenas de inimigos que surgem por todos os lados.

A verdade é que batalhas eram bastante organizadas, e travadas em grupo, não individualmente.

Pra que formar uma coluna e defender aquela escada se a gente pode simplesmente se espalhar pelo pátio e lutar individualmente, né?


2. Escolha das armas

Espadas são legais, eu concordo. Machados também. Mas a verdade inconveniente é que a maior parte das batalhas era resolvida exclusivamente com lanças. Em combates entre blocos, onde a mobilidade individual é limitada, o alcance elevado da lança é a maior vantagem que se pode desejar.

A espada é superior em duelos individuais ou quando os blocos de soldados se chocavam e se misturavam, mas isto raramente acontecia. Em geral, o lado que está levando a pior simplesmente recua. Combates de curta distância causam baixas demais para serem uma estratégia padrão.

Com a formação organizada e o protagonismo das armas de haste, uma batalha devia ser mais ou menos assim


3. As Armaduras

Existe todo uma capítulo à parte quanto à falta de realismo e fidelidade histórica na aparência das armaduras, tanto em filmes de fantasia (onde isso é mais desculpado) quanto em filmes supostamente históricos. Não é disso que vou reclamar aqui, mas do funcionamento delas.

Muitas vezes, vemos espadas e flechas cortando e penetrando facilmente através de armaduras e elmos. O que não faz o menor sentido. A resposta é tão óbvia que chega a ser ridícula: se a armadura fosse tão inútil, as pessoas não usariam. A verdade é que poucos golpes causavam ferimentos graves.

Se uma espada corta tão bem, pra que se dar ao trabalho de usar armadura? Estilo?


4. O Sangue

Esse erro é mais ou menos uma extensão do anterior. Filmes como Cruzada adoram colocar shots de litros de sangue voando a cada golpe de espada, para aumentar a dramaticidade e fazer os fãs de gore urrarem. Mas os combatentes medievais usavam, por baixo da armadura, roupas grossas e acolchoadas, para aumentar a proteção. Mesmo no caso de um golpe que penetrasse a carne, as várias camadas de tecido impediriam o sangue se sair voando cinematograficamente, exceto em partes expostas do corpo (como o rosto, dependendo do tipo de elmo).


O velho combo: armaduras que não funcionam + inimigos que são bolhas de sangue prestes a explodir


5. O Resultado

Muitos cineastas acham que o único desfecho apropriado para uma batalha é a morte de todos os combatentes de um dos exércitos, definindo assim a vitória do outro. Talvez isso faça sentido quando seus inimigos são Uruk-Hai, mas humanos tendem a recuar, se render ou fazer acordos assim que se sentem em desvantagem.

De fato, a quantidade de mortos em uma batalha medieval costumava ser minoritária, o que explica como um mesmo cavaleiro conseguia participar de várias batalhas ao longo da vida. Além disso, uma guerra é como uma discussão, na qual os seus soldados são seus argumentos. Assim que você demonstrou sua superioridade e ganhou a discussão, não tem por que gastar mais soldados eliminando o oponente completamente.

De um lado, 100% de mortos. Do outro, 95%. Parece que temos um vencedor! Ao menos até ele perder tudo de novo daqui a uma semana, por falta de guerreiros

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